quinta-feira, 31 de outubro de 2019

Termo legal da falência

O insucesso na condução, que acaba por levar a insolvência não é um fato isolado e súbito, mas sim antecedido por uma série de eventos que conduziram o devedor a situação de insolvência. Por vezes, ao perceber que a situação está se tornando insustentável o empresário lança mão de meios fraudulentos ou impensados para tentar poupar parte do seu patrimônio ou beneficiar alguns credores em detrimento de outros.
Tendo em vista esse cenário a LRE estabelece que quando da prolação da sentença declaratória de falência o juiz deverá fixar o termo legal da falência conforme art. 99, II, sendo que neste período as operações do empresário serão tidas por suspeitas e investigadas para se apurar eventuais fraudes, portanto o termo legal de falência não invalida, mas põe em suspeição.

Da instauração do juízo universal da falência

Decretada a falência pelo juízo competente, instaura-se o chamado juízo universal da falência que atrairá para si todas as ações que envolvam o devedor falido. Trata-se do que os doutrinadores chamam de aptidão atrativa do juízo falimentar, passa a ser o juízo competente para processar e julgar todas as demandas de cunho patrimonial relativas ao devedor.
Essa universalidade, todavia, não é absoluta, visto que há certas demandas judiciais que não são atraídas para ele, tais como as causas trabalhistas, fiscais, ações que demandam quantia ilíquida e as que forem parte a União ou ente federal.
Cabe, entretanto, ressaltar que todas as ações do devedor falido (que corram dentro ou fora do juízo universal) terão prosseguimento com o administrador judicial que deverá ser intimado para representar a massa falida sob pena de nulidade do processo.

Da suspensão da prescrição e das ações de execuções contra o devedor falido

A decretação da falência suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário. Essa suspensão será decretada na própria sentença conforme determinação do art. 99, V da LRE.

Essa regra também comporta exceções:

a.    Ações que demandam quantia ilíquida – como a falência é um processo de execução seu rito é incompatível com o das ações que demandam quantia ilíquida, razão pela qual estas ações não se suspendem e nem são atraídas para o juízo universal, devendo prosseguir na Vara em que tramita até que o valor seja tornado liquido;

b.    Reclamações trabalhista – pelos mesmos motivos do item anterior e observando que elas correram na Justiça do Trabalho;




c.    Execuções fiscais das Fazendas Públicas – não se sujeitam a nenhum tipo de concurso de credores (não obstante os créditos tributários que só serão pagos respeitando a ordem, classificação estabelecida na Lei Falimentar).

Pagamento dos credores

Os pagamentos na falência serão feitos pelo administrador judicial com observância da ordem legal, que distingue os credores em classe e espécie.

Credores extraconcursais
a.    Credores da massa – as despesas com a administração da falência inclusive a remuneração do administrador judicial, são créditos extraconcursais, pois devem ser pagos antes dos credores da falida. Toda e qualquer despesa com a administração da falência ou com o andamento do processo falimentar também tem natureza de crédito extraconcursal, com absoluta preferência, inclusive sobre as restituições em dinheiro.


b.    Restituições em dinheiro 

Exemplo: A contribuição do empregado para o INSS, adiantamento com base em um contrato de câmbio, entre outros. Esses créditos também são extraconcursais e devem ser pagos antes dos credores da falida.

Credores da falida (créditos concursais)

A ordem de classificação distingue os pagamentos na falência em 8 classes:

1.    Créditos trabalhistas e equiparados e os decorrentes de acidente de trabalho.

Nesta primeira classe os credores trabalhistas e equiparados receberam em 1° classe os créditos até o limite de 150 salários mínimos sendo que o excedente será recebido na categoria de créditos quirografários. Quanto às indenizações a lei não estabelece limite. 

2.    Créditos com garantia real

Esses créditos serão pagos até o limite do valor do bem gravado, ou seja, até a importância efetivamente arrecada com sua venda. 

3.    Créditos tributários

Independentemente da natureza, mas sem as multas que deverão ser pagas na 7° classe. 

4.    Créditos com privilégio especial – art. 964 do CC

Tem privilégio especial os que estão arrolados no art. 964 do CC, os que assim forem definidos por lei e aqueles que a lei conferiu aos titulares direito de retenção sobre a coisa dada em garantia. 

5.    Créditos com privilégio geral

Art. 965 do CC, art. 67 da LRE e os assim definidos em outras leis. 

6.    Créditos quirografários

Representa todos os créditos que não possuem nenhuma espécie de privilégio ou garantia, sendo que nela também entra o saldo de salário que ultrapassar 150 salários mínimos, bem como o coberto pelo resultado da alienação dos bens vinculados. 

7.    Multas e penas pecuniárias

Nessa categoria serão pagas todas as multas e demais penas por infração, inclusive multas tributárias. 

8.    Créditos subordinados

São aqueles que assim forem classificados em lei ou em contrato e os créditos dos sócios e administradores sem vínculo empregatício.

Pagamento de juros e correção monetária

Antes de partilhar o acervo entre os sócios da falida, o administrador judicial deve destinar os recursos existentes para o pagamento dos juros posteriores a falência (a falência suspende a fluência de juros), observando novamente a mesma ordem de classificação.
A correção monetária de outra sorte, deve ser paga juntamente com o principal da dívida de cada credor posto que ela nada acrescenta no valor da obrigação, mas apenas preserva o poder aquisitivo da moeda.

Pagamento dos sócios ou acionistas
Caso, após todos os pagamentos sobre dinheiro, este valor será partilhado entre os sócios e acionistas na proposição de sua participação no capital social.

Evolução histórica do Direito Cambial

Período Italiano (até 1.650)

Nessa época surgiu o câmbio trajetício onde o transporte da moeda em determinado trajeto ficará por conta e risco dos banqueiros e, se instrumentalizará por meio de 2 documentos.

a.    Cantio: o banqueiro reconhecia a dívida e prometia pagar no prazo, lugar e moeda convencionados.

(apontado como a origem da nota promissória por conter uma promessa de pagamento)

b.    Littera Cambii: o banqueiro ordenava ao seu correspondente que pagasse quantia fixada no título.

(apontada como origem da letra de câmbio por se referir a uma ordem de pagamento)

Período Francês (1.650 a 1.848)

Nessa fase consolidou-se a ideia de que em um único documento pudessem ser pagos diversos negócios merecendo destaque:

a.    O surgimento da cláusula à ordem: é a clausula que indica em um instrumento que ele é negociável ou transferível por meio de endosso.

b.    Criação do título cambiário do endosso: decorre da cláusula à ordem e é um meio utilizado para permitir ao beneficiário do título transferi-lo independentemente de autorização. (cessão do crédito cambiário)

Período Alemão (1.848 a 1.930)

Nessa época com o intuito de acabar com o grande número de normas que tratavam de títulos de crédito, foi editada a Ordenação Geral Cambial Alemã que teve grande influência no desenvolvimento do direito cambial e auxiliou a consolidar os títulos de crédito como instrumentos viabilizadores da circulação de direitos.

Período Uniforme (após 1.930)

A quarta e última fase do período cambial iniciou-se em 1.930 com a realização da Convenção de Genebra sobre títulos de crédito e a consequente aprovação, pouco depois, da Lei Uniforme das Cambiais de Cheque.

O Brasil participou da Convenção e aderiu ao que nela ficou decidido, sendo que os Decretos 57.663/66 e 57.595/66 promulgaram sua vigência no Brasil.

Vale lembrar que o CC/2002 trata nos arts. 887 e 926 de alguns conceitos e institutos do direito cambiário, mas o faz de forma superficial e criticável, principalmente tendo caráter subsidiário destas normas como determina o art. 903.


Título de crédito = DOCUMENTO NECESSÁRIO PARA O EXERCÍCIO DO DIREITO LITERAL E AUTÔNOMO NELE MENCIONADO. (Césare Vivante)

Vencimento

Pode ser conceituado como o dia em que a soma constante da cambial pode ser cobrado pelo portador. O vencimento marca o momento em que a obrigação cambiária se torna exigível, seja em face do devedor principal ou de seus avalistas e demais coobrigados, desde que tenha havido o protesto em tempo hábil.

A indicação do vencimento deve ser:

a.    Legal, porque só pode ser um daqueles previsto no art. 33 da LUG;

b. Único, em razão da indivisibilidade da soma cambiária, não se admitindo vencimentos diferentes, sucessivos ou alternativos.

c.  Incondicional, porque não pode depender da ocorrência de um evento futuro e incerto.

d.    Preciso, porque não pode depender de fato que, embora seja possível, tenha data incerta, como a morte de uma pessoa.

e.    Possível, a data de vencimento deve existir e ser futura ou concomitante a emissão.

Obs.: Título que não indique a data de vencimento entende- se como pagável à vista.

Modalidades de vencimento

Vencimento ordinário – é aquele que se dá pelo simples decurso de tempo, de acordo com a que esteja no título de crédito, esse tipo de vencimento apresenta-se nas seguintes modalidades:

a.  Vencimento à vista: os títulos de crédito trazem menção a data ou trazem a expressão “pague-se na apresentação” ou outra que equivalha.

b.    Vencimento a dia certo: o título de crédito trás o dia do vencimento determinado em seu texto. Ex. Pague-se no dia 01/12/14. E a modalidade mais comum.

c.  Vencimento a tempo ou a termo certo da data: nessa modalidade conta-se a número pré-fixado de dias a partir da emissão ou saque do título de crédito. Ex.: “Pague-se a 60 dias da emissão.”

d.    Vencimento a termo ou tempo certo da vista “aceite”: conta-se um número pré-fixado de dias a partir da apresentação para aceite. Ex. “pague-se a 30 dias a vista”.

Vencimento extraordinário – É aquele causado por um fato exterior, anormal e imprevisto que acelera o vencimento, fazendo como que a quantia seja exigível antes da prevista no título de crédito.

Ele pode se dar em virtude de:

a.    Falta ou recusa do aceite: provida pelo protesto, antecipando-se, em relação ao sacador de título.

b.    Declaração da falência do principal obrigado, antecipando-se o vencimento em relação a todos os envolvidos na relação cambial (devedores coobrigados).

Prorrogação do vencimento

Pode se dar se houver acordo entre as partes, entretanto, deve obedecer aos princípios da cartularidade e literalidade, ou seja, essa circunstância deve ser anotada no título, para proteção e segurança das partes (com exceção da duplicata, que pode ser feita em documento separado).

Efeitos do vencimento

a.    Exigibilidade da obrigação

O primeiro efeito do vencimento e que ele torna exigível a quantia cambiária, que pode ser cobrada à partir de então. Caso o cumprimento da obrigação seja retardado pelo devedor opera-se a mora debendure (por parte do devedor) acarretando os acréscimos permitidos por lei, se o retardamento se der por embaraços por parte de credor opera-se a mora accipiendi que autoriza o depósito judicial da quantia.

Perda da circulabilidade

O titulo não mais poderá ser transferido por endosso.

Termo inicial para protesto

A partir do vencimento se fixa o início do prazo para protesto do título, o que irá garantir o direito de cobrar os coobrigados.

Termo inicial da prescrição

Efeitos importante do vencimento e que ele marca o início do prazo prescricional que, após esgotado retira o exequibilidade do título (deixa de ser título executivo extrajudicial).

quinta-feira, 17 de outubro de 2019

Princípio do Contraditório no Novo CPC

Se você digitar a palavra “contraditório” no instrumento de busca dentro do texto do CPC vigente, irá encontrar apenas uma ocorrência, qual seja: no atual artigo 536, que trata dos embargos de declaração, os quais deverão ser “opostos, no prazo de 05 dias, em petição dirigida ao juiz ou relator, com indicação do ponto obscuro, contraditório ou omisso, não estando sujeitos a preparo”.

Como se percebe, dentro desse contexto, o termo “contraditório” aparece em seu sentido adjetivo, e não substantivo. Não há, portanto, menção expressa ao princípio do contraditório no CPC de 1973, talvez pelo momento histórico que se passava à época.

No texto do Novo CPC a situação se inverte: no artigo dedicado aos embargos declaratórios, utiliza-se a expressão “eliminar contradição” (art. 1.022, I); e o termo “contraditório” é utilizado apenas em seu sentido substantivo, em todas as 07 situações nas quais aparece.

Vejamos cada uma delas.

Logo no início do texto, no artigo 7º, é ressaltada a igualdade entre as partes, a paridade de tratamento e de armas para o litígio, devendo o juiz zelar pelo efetivo contraditório. Oportuna e adequada a consagração do princípio do contraditório na Parte Geral do Novo CPC, no papel de norma informadora de toda a nova sistemática processual, a demonstrar também conformidade em relação ao Texto Constitucional de 1988.

No artigo 98, §1º, inciso VIII, que trata da gratuidade da justiça, é destacado que ela compreende também os depósitos previstos em lei para interposição de recurso, propositura de ação e para a prática de outros atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório. A parte final do dispositivo deixa claro, pois, de forma feliz, que se trata de um rol meramente exemplificativo, a exigir dos operadores do direito, e principalmente do magistrado, sensibilidade em relação aos que, de fato, têm direito à gratuidade.

Tratando dos vícios da sentença de mérito proferida sem a integração do contraditório, o artigo 115 do Novo CPC distingue situações de nulidade e ineficácia, a depender do tipo de litisconsórcio necessário existente: se unitário (no qual a decisão deve ser uniforme em relação a todos os litisconsortes), a sentença será nula; se simples, ineficaz apenas em relação ao que não foi citado.

No artigo 329, inciso II, o Novo CPC indica a forma de respeito ao princípio do contraditório: até a fase de saneamento do processo, o autor poderá, com o consentimento do réu, aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir, ocasião na qual, em obediência ao contraditório, o réu poderá se manifestar no prazo mínimo de 15 dias e ainda requerer prova suplementar.

No dispositivo dedicado à conhecida prova emprestada também há expressa menção à necessidade de respeito ao princípio do contraditório: “O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório” (art. 372).

Ao tratar da coisa julgada material, o artigo 503 dispõe que: “A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida”. O parágrafo primeiro, por sua vez, acrescenta que a questão prejudicial, decidida expressa e incidentalmente no processo, também terá eficácia de coisa julgada material quando reunir os seguintes requisitos: 1) dessa resolução depender o julgamento do mérito; 2) a seu respeito tiver havido contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia; e 3) o juízo tiver competência em razão da matéria e da pessoa para resolvê-la como questão principal. Mais uma vez o contraditório em sentido substantivo aparece expressamente no texto do Novo Estatuto Processual.

Por fim, a última situação na qual aparece expressamente a menção ao princípio do contraditório no texto do Novo CPC é no artigo 962, §2º, que trata da execução da tutela de urgência concedida por decisão estrangeira. Assim, o referido dispositivo esclarece que isso deverá ser feito no Brasil por meio de carta rogatória e que a aludida tutela de urgência poderá ser executada mesmo se concedida sem a oitiva do réu, desde que isso seja garantido posteriormente, em obediência ao princípio do contraditório.

 *TEXTO DISPONIBILIZADO PELO IDC (Instituto de Direito Contemporâneo).

Condições da ação no Novo CPC


Sem entrar nos detalhamentos doutrinários em torno da extinção ou não da categoria processual das “condições da ação” (principalmente em função da supressão dessa expressão no CPC de 2015 – v. CPC de 1973, art. 267, VI), fato é que o Novo Código é expresso ao declarar que “para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade” (art. 17).

Além disso, no dispositivo que trata da extinção do processo sem resolução do mérito, uma das hipóteses é “a ausência de legitimidade ou de interesse processual” (art. 485, VI).
Observa-se, portanto, que a possibilidade jurídica do pedido desaparece desse campo, por se tratar nitidamente de questão de mérito, conforme há muito a doutrina já preconizava: “se o juiz, ao examinar a inicial, verifica existir vedação expressa no ordenamento jurídico material ao pedido do autor, deve indeferi-la liminarmente por impossibilidade jurídica, extinguindo o processo. Esse resultado, todavia, implica solução definitiva da crise de direito material. Embora tal conclusão seja possível mediante simples exame da inicial, o julgamento põe fim ao litígio, pois o autor não tem o direito afirmado. Pedido juridicamente impossível equivale substancialmente ao julgamento antecipado com fundamento no art. 330, I, do CPC. A pretensão deduzida pelo autor não encontra amparo no ordenamento jurídico e, por isso, deve ser rejeitada. Tanto faz que essa conclusão seja possível desde logo, porque manifesta a inadmissibilidade, ou dependa de reflexão maior por parte do juiz sobre a questão de direito.” (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 270).

Não há dúvidas também que o magistrado, ao analisar a legitimidade e o interesse processual, adentre nos elementos de mérito da demanda. No entanto, nesses casos, diferentemente do que ocorre com a possibilidade jurídica do pedido, a atividade jurisdicional não se esgota nesse momento, tendo em vista que ainda haverá uma crise de direito material a ser resolvida. Pelos mesmos motivos que a conhecida “carência da ação” (CPC de 1973, art. 301, X) também desaparece do Novo Código, sendo substituída, nos dispositivos que tratam das matérias a serem alegadas em preliminar de contestação, por “ausência de legitimidade ou de interesse processual” (Novo CPC, art. 337, XI). 

*TEXTO DISPONIBILIZADO PELO IDC (Instituto de Direito Contemporâneo).

Novo juízo de admissibilidade dos recursos excepcionais

Segundo os arts. 1.029, caput, e 1.030, parágrafo único, do Novo CPC, os recursos especial e extraordinário serão interpostos, em petições distintas, perante o presidente ou vice-presidente do tribunal recorrido que, ao receber o recurso, intimará a parte contrária para apresentar contrarrazões no prazo de 15 dias, findo o qual os autos serão remetidos ao respectivo tribunal superior, independentemente de juízo de admissibilidade.

Nas palavras de Teresa Arruda Alvim Wambier, Maria Lúcia Lins Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogerio Licastro Torres de Mello, “trata-se de alteração relevante que teve como objetivo evitar um recurso: o que cabe, à luz do CPC/73, da decisão que nega seguimento ao recurso extraordinário ou ao recurso especial. Esta supressão torna evidentemente o sistema mais simples e a simplicidade foi um dos principais objetivos almejados pelo legislador.” (Primeiros comentários ao novo código de processo civil, São Paulo: RT, 2015, p. 1.497).

De fato, a intenção do legislador foi simplificar o procedimento e permitir o trânsito direto dos recursos especial e extraordinário aos tribunais superiores. Entretanto, por outro lado, é preciso destacar que a publicação de um novo marco legal processual, por si só, não resolve o problema da prestação célere da justiça ou do abarrotamento de demandas no Poder Judiciário. É preciso que esse árduo trabalho de elaboração de um Novo Código de Processo Civil, que teve a felicidade de ser o primeiro a se concretizar em ambiente democrático, também seja acompanhado de mudanças estruturais (sobretudo no Poder Judiciário) e ideológicas (entre os operadores do direito em geral).

Eis a sempre prudente advertência de José Roberto dos Santos Bedaque: “(…) Os litígios são em número muito superior à capacidade de absorção do Poder Judiciário – o que acaba comprometendo a tão almejada celeridade processual. Embora as estatísticas de que dispomos se limitem a apontar o volume de processos e a quantidade atribuída a cada juiz, ou a relação juiz/população, sem esclarecer a quantidade de teses repetidas, cujos processos muitas vezes são examinados pela assessoria, ainda assim é possível afirmar que a quantidade supera em muito a capacidade de absorção. Apesar de os números nem sempre significarem muita coisa, é notória a insuficiência estrutural do Poder Judiciário brasileiro.” (Efetividade e técnica processual, São Paulo: Malheiros, 2010, p. 21).

Nesse sentido, caberá indagar se o STJ e o STF irão se aparelhar a tempo de operacionalizar essa mudança, tendo em vista o grande número de recursos especiais e extraordinários que subirão diretamente para juízo de admissibilidade. Nas palavras de Daniel Amorim Assumpção Neves, “Se os tribunais superiores já reclamam do volume de trabalho, a retirada desse filtro no segundo grau piorará exponencialmente a situação. Certamente será uma alegria para os advogados, mas os tribunais superiores terão que se preparar para o aumento substancial de recursos.” (Novo código de processo civil: inovações, alterações e supressões comentadas, São Paulo: Método, 2015, p. 575).

E o Enunciado nº 365 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) ainda acrescenta que: “Aplica-se a regra do art. 1.030, parágrafo único, aos recursos extraordinário e especial pendentes de admissibilidade ao tempo da entrada em vigor do CPC, de modo que o exame da admissibilidade desses recursos competirá ao STF e STJ.”.

Não por acaso, já existe no Senado Federal o Projeto de Lei nº 414, protocolado em 1º de julho de 2015, de autoria do Senador Blairo Maggi (PR-MT), a fim de alterar o Novo CPC, criar o “recurso de admissão” (atual agravo de decisão denegatória de RE ou REsp) e retornar à forma atual de juízo de admissibilidade dos recursos extraordinários lato sensu.

Na justificativa apresentada pelo referido parlamentar, há o registro de que “(…) a exclusão do filtro prévio realizado pelos tribunais originário no novo Código de Processo Civil irá propiciar, a um só tempo, dois aspectos negativos à prestação jurisdicional:

1.  incremento no número de processos nos tribunais superiores, como visto acima e

2.        dificulta o trabalho dos Ministros responsáveis pelo exame do processo, que terão de realizar pela primeira vez a análise dos requisitos de admissibilidade recursal.”

*TEXTO DISPONIBILIZADO PELO IDC (Instituto de Direito Contemporâneo).

Boa-fé no Novo CPC

O instituto da boa-fé, que aparece expressamente no CPC vigente apenas em seu artigo 14, inciso II, tratando dos deveres dos sujeitos processuais é encontrado no texto do Novo CPC em pelo menos três dispositivos distintos, quais sejam:

1.   artigo 5º – como dever de todo e qualquer sujeito do processo;

2.  artigo 322, §2º – como princípio norteador da interpretação do pedido formulado; e

3. artigo 489, §3º – como princípio norteador da interpretação das decisões judiciais.

Dessa forma, verifica-se que a boa-fé objetiva, seus deveres anexos (deveres de respeito, confiança, lealdade, cooperação, honestidade, razoabilidade etc.) e seus conceitos parcelares (supressiosurrectiotu quoqueexceptio dolivenire contra factum proprium non potest e duty to mitigate the loss), muito caros aos civilistas (cf. TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. São Paulo: Método, 2014), ganham importância central também para a Teoria Geral do Processo.

Sobretudo a partir da publicação do Código Civil de 2002, os tribunais brasileiros passaram a prestigiar a boa-fé no campo do direito material, posicionando-a como tema principal dentro da teoria geral dos contratos. Eis o Enunciado nº 26 da I Jornada de Direito Civil do STJ/CJF: “A cláusula geral contida no art. 422 do Novo Código Civil impõe ao juiz interpretar e, quando necessário, suprir e corrigir o contrato segundo a boa-fé objetiva, entendida como exigência de comportamento leal dos contratantes.”.

No campo do direito processual, também já se encontram decisões recentes do Superior Tribunal de Justiça utilizando o princípio da boa-fé para interpretar a conduta das partes (STJ, AgRg no REsp 1.439.136 e REsp 1.119.361). Nesse sentido, é dever dos sujeitos processuais se comportar conforme a boa-fé, expressando a verdade em suas manifestações, colaborando para com a rápida solução do litígio (Novo CPC, art. 6º) e utilizando sem abuso seus poderes processuais.

A litigância de má-fé permanecerá com as mesmas hipóteses já existentes no vigente artigo 17 (Novo CPC, artigo 80, I a VII). O teto para a multa, entretanto, em vez do atual 1% do valor da causa, irá para 10% do valor corrigido da causa (ou 10 salários mínimos nos casos de valor da causa irrisório ou inestimável), além da possível indenização para a parte prejudicada (Novo CPC, art. 81).

Por fim, cabe ressaltar que o Novo CPC vai além, trazendo o princípio da boa-fé também para o campo hermenêutico, a nortear a interpretação dos pedidos formulados perante o Judiciário e das próprias decisões judiciais.

Isso trará efeitos práticos, sobretudo no âmbito recursal, no qual o tribunal deverá decidir desde logo o mérito quando, por exemplo, interposta a apelação e a causa estiver em condições de imediato julgamento, decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir (Novo CPC, art. 1013, §3º, II).

Também para a hipótese de ajuizamento de ação rescisória fundada em violação manifesta de norma jurídica (Novo CPC, art. 966, V), o princípio da boa-fé, como norma jurídica que é, poderá ser invocado como fundamento para a rescisão.  


*TEXTO DISPONIBILIZADO PELO IDC (Instituto de Direito Contemporâneo).

Distribuição dinâmica do ônus da Prova no Novo CPC

Das novidades trazidas pelo Novo CPC no campo das provas cíveis, importantíssima é a consagração da teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, agora positivada no artigo 373, §1º do Novo Código.

Segundo essa teoria, o ônus da prova incumbe a quem tem melhores condições de produzi-la, diante das circunstâncias fáticas presentes no caso concreto.

Não se trata, porém, de algo novo no ordenamento jurídico brasileiro.

O Código de Defesa do Consumidor (Lei Federal nº 8.078/90) indicou expressamente como direito básico do consumidor a “facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências” (artigo 6º, inciso VIII).

Nesse sentido, a técnica da inversão do ônus da prova, presentes os pressupostos legais, é clara aplicação da teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova. E diante da discussão acerca do momento adequado para essa inversão, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já pacificou o entendimento de que seria na fase de saneamento do processo, a fim de permitir, “à parte a quem não incumbia inicialmente o encargo, a reabertura de oportunidade para apresentação de provas” (REsp 802.832/MG, 2ª Seção).

Além das demandas envolvendo Direito do Consumidor, o STJ já tem admitido a aplicação dessa teoria em outros casos concretos, com base numa interpretação sistemática e constitucionalizada da legislação processual em vigor (cf. STJ, REsp 1.286.704/SP; REsp 1.084.371/RJ; REsp 1.189.679/RS; e RMS 27.358/RJ).

O Novo CPC mantém a atual distribuição do ônus probatório entre autor (quanto ao fato constitutivo de seu direito) e réu (quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor), abrindo-se, porém, no §1º do artigo 373, a possibilidade de aplicação da teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova pelo juiz no caso concreto.

O dispositivo mencionado tem a seguinte redação: “Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído”.

Assim, o Novo CPC permite expressamente a distribuição dinâmica do ônus da prova pelo juiz e ainda abre a possibilidade de a legislação esparsa prever outras hipóteses de aplicação dessa teoria. O dispositivo ressalta também a necessidade de fundamentação específica da decisão judicial que tratar do tema e positiva o entendimento pacificado no STJ de que o momento adequado para a redistribuição do ônus da prova é o saneamento do processo (Novo CPC, art. 357, inciso III).

Além disso, o §2º do aludido artigo 373 do Novo CPC dispõe que a decisão de redistribuição do ônus da prova não pode gerar “situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil”. Em outras palavras, é dizer que, caso a prova seja “diabólica” para todas as partes da demanda, o juiz deverá decidir com base nas outras provas eventualmente produzidas, nas regras da experiência e nas presunções.

Por fim, cabe mencionar que a possibilidade de distribuição diversa do ônus da prova por convenção das partes continua possível no Novo CPC, com as mesmas exceções atualmente existentes (quando recair sobre direito indisponível da parte ou quando tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito – CPC, art. 333, parágrafo único e Novo CPC, art. 373, §3º), podendo o acordo ser celebrado antes ou durante a demanda (§4º).
*TEXTO DISPONIBILIZADO PELO IDC (Instituto de Direito Contemporâneo).

Intervenção de terceiros no Novo CPC

Comecemos pelas alterações no título do Novo CPC que trata das modalidades de intervenção de terceiros na demanda. Nesse sentido, ressaltamos que a assistência é finalmente (e corretamente) realocada para o referido título, mantendo-se a distinção entre assistência simples e litisconsorcial, com a inovação de se diferenciar as disposições comuns (arts. 119 e 120) das disposições específicas (arts. 121 a 124).

A denunciação da lide (arts. 125 a 129) e o chamamento ao processo (arts. 130 a 132) são mantidos como forma de intervenção de terceiros, com pontuais inovações.

As grandes novidades são o incidente de desconsideração da personalidade jurídica (arts. 133 a 137) e o amicus curiae (art. 138) como novas modalidades criadas pelo Novo CPC.

A nomeação à autoria desaparece desse título, mas o seu espírito está presente nos artigos 338 e 339 do Novo Código como hipóteses de correção da ilegitimidade passiva. Nas palavras de Cássio Scarpinella BUENO: “(…) a nova regra substitui, com inegáveis vantagens, a disciplina da ‘nomeação à autoria’ do CPC atual que, incompreensivelmente, depende da concordância do nomeado para justificar a correção do polo passivo do processo, exigência injustificável em se tratando de processo estatal.” (Novo código de processo civil anotado, São Paulo: Saraiva, 2015, p. 255).

A oposição, por sua vez, é levada para o título que trata dos procedimentos especiais (arts. 682 a 686), sem grandes alterações em relação aos dispositivos ainda vigentes: “Fez-se bem em não mais tratar a oposição como modalidade de intervenção, porque é, em verdade, manifestação do exercício do direito de ação. Mas, por outro lado, não há razão para que a oposição esteja entre os procedimentos especiais, uma vez que inexiste peculiaridade procedimental alguma que a particularize.” (Teresa Arruda Alvim WAMBIER, Maria Lúcia Lins CONCEIÇÃO, Leonardo Ferres da Silva RIBEIRO e Rogerio Licastro Torres de MELLO, Primeiros comentários ao novo código de processo civil, São Paulo: RT, 2015, p. 1018). 

Para uma melhor visualização desse novo título, segue um quadro esquemático abaixo:

*TEXTO DISPONIBILIZADO PELO IDC (Instituto de Direito Contemporâneo).

Produção Antecipada de Prova no Novo CPC

A produção antecipada de prova é a primeira prova em espécie tratada pelo Novo Código, seguida da ata notarial, do depoimento pessoal, da confissão, da exibição de documento ou coisa, da prova documental, da prova testemunhal, da prova pericial e da inspeção judicial.

Afastada a sua classificação como cautelar típica, tal como ocorre no CPC vigente (mesmo porque o Novo CPC não traz nenhuma espécie de cautelar nominada - Arts. 301 e 305), a produção antecipada de prova é tratada no capítulo específico das provas, sendo admitida em três hipóteses (Novo CPC, art. 381):

1.   Haja fundado receio de que venha a tornar-se impossível ou muito difícil a verificação de certos fatos na pendência da ação;

2.    A prova a ser produzida seja suscetível de viabilizar a autocomposição ou outro meio adequado de solução de conflito;

3.    O prévio conhecimento dos fatos possa justificar ou evitar o ajuizamento de ação.

Como se pode observar, as hipóteses de cabimento são bastante genéricas.

Além da já conhecida urgência na produção da prova diante de fundado receio de que venha a se tornar impossível ou muito difícil a sua produção (CPC, art. 847, II), o Novo CPC também abarca a possibilidade de a prova antecipadamente produzida viabilizar a autocomposição, na esteira do estímulo às técnicas de solução consensual de conflitos (Novo CPC, art. 3º, §3º), e também o prévio conhecimento dos fatos possa justificar ou evitar o ajuizamento da ação (talvez a mais ampla das hipóteses previstas).

A produção antecipada de prova perde, portanto, o seu caráter tradicionalmente cautelar, pensado apenas como solução para os casos em que haja receio de que aquela prova não possa vir a ser produzida num futuro próximo.

Quanto à competência para sua apreciação, o Novo CPC deixa claro que é do juízo do foro onde a prova deva ser produzida ou do foro de domicílio do réu (art. 381, §2º), ressaltando, ainda, que a produção antecipada da prova não previne a competência do juízo para a ação que venha a ser proposta (§3º).

Outra novidade interessante é a possibilidade de a produção antecipada de prova assumir caráter não contencioso: “Aplica-se o disposto nesta Seção àquele que pretender justificar a existência de algum fato ou relação jurídica, para simples documento e sem caráter contencioso, que exporá, em petição circunstanciada, a sua intenção.” (Novo CPC, art. 381, §5º).

Em outras palavras, é dizer que a produção antecipada de prova não precisa necessariamente estar ligada a uma demanda futura, podendo se prender unicamente à intenção de documentação de um fato ou de uma relação jurídica, sem caráter contencioso, o que rompe totalmente com a concepção tradicional e atual do instituto.

Diante de tantas modificações e nuances, será o Poder Judiciário quem delimitará a interpretação das hipóteses genéricas de cabimento e terá que coibir eventuais abusos advindos da produção antecipada de prova sem caráter contencioso, mesmo porque a documentação de fatos e relações jurídicas pode ser mais facilmente materializada por atas notariais e escrituras públicas, por exemplo.

*TEXTO DISPONIBILIZADO PELO IDC (Instituto de Direito Contemporâneo).